Novas eleições já
(fonte: Carta Capital)
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A sessão de horror no Congresso foi o alerta geral de que o fundo do poço está longe de chegar caso a dupla Cunha-Temer alcance o comando do País. E, ironicamente, é Dilma Rousseff, símbolo da divisão política atual, quem tem mais chances de dar um desfecho à crise. Dilma é a única com legitimidade moral para pautar um pacto em torno de novas eleições, por ser a única integrante da classe política em Brasília sobre quem não pesa qualquer suspeita de corrupção.
Se costurar uma Proposta de Emenda à Constituição e chamar eleições, Dilma conseguirá unir tanto os que resistem ao golpe, quanto setores da oposição verde-amarela que não querem Temer (além, é claro, de todos os aspirantes imediatos ao Palácio do Planalto). Dilma tem a foice no pescoço, posta por esse mesmo Congresso, e portanto nada tem a perder. Se conseguir negociar um acordo nacional como o Pacto de Olivos, na Argentina de 1994, convocando novas eleições mediante pequena reforma constitucional, Dilma reescreverá sua biografia no último minuto e entrará grande para a história.
Se não conseguir (Eduardo Cunha ainda é o rei do baixo clero), não será uma derrota para Dilma e o PT, e sim outro imenso argumento para denunciar a injustiça do golpe. Propondo um pacto com novas eleições, Dilma desorganizará todo o tabuleiro da oposição verde-amarela – promovendo a discórdia entre tucanos aecistas e alckmistas pelo menos. É melhor do que fazer nada.
Se Dilma jogar a ideia para a sociedade neste momento, poderá inclusive embolar o trâmite do impeachment no Senado. A Câmara Alta do Congresso tem diante de si a responsabilidade de revisar a decisão esdrúxula da Câmara que já corre o mundo como um mico histórico. Uma pesquisa do Ibope realizada entre 14 e 18 de abril e divulgada no domingo 24, mostra que 62%% dos brasileiros querem novas eleições. Terão certamente apoio da comunidade e da imprensa internacional (a julgar pela repercussão lá fora). Mesmo setores da imprensa nacional apoiariam.
O cenário ideal (e mais do que justo) seria o de eleições gerais para a Presidência e o Congresso, afinal a nata da picaretagem está no Parlamento. Mas não é o cenário realista. A maioria dos deputados jamais abriria mão de seus mandatos, por diferentes razões, legítimas ou não. A discussão em torno de eleições ao Congresso se perderia em brigas judiciais intermináveis que não trariam outra coisa senão fadiga.
Dilma tem de propor o pacto com mudanças na legislação eleitoral. E a divisão da eleição geral em dois momentos, a cada dois anos, poderia ser uma das propostas. Teríamos eleição para presidente em outubro de 2016 e para o Congresso em 2018, dividindo o processo eleitoral entre o Executivo e o Legislativo, como é nos Estados Unidos e na Argentina. O modelo de dois tempos é até mais interessante que o brasileiro. Dois anos após ser eleito, o presidente tem de arregaçar as mangas e pedir votos para eleger sua base, mediante um conjunto de propostas que quer aprovar no Congresso.
A eleição será centrada no Parlamento, não como hoje, em que os votos para deputados se perdem em meio a campanhas massivas em torno da figura dos candidatos a presidente. Qualquer base que nascer daí será mais sólida que a gelatina geral da política brasileira. A presidente poderia propor até outras inovações, como voto em lista ou distrital misto, fomentando um debate sobre uma reforma política.
Se propuser novas eleições, Dilma recobrará o poder de pautar a política nacional (coisa que não conseguiu desde que foi reeleita). Terá tecnicamente concordado com um encurtamento de dois anos de seu mandato. Na prática, porém, Dilma já teve o mandato encurtado. A grande questão com o que o País se depara hoje é a implantação de um governo fruto de um golpe que se baseou na usurpação da soberania popular do voto.
O povo não quer Temer, como mostram algumas pesquisas de opinião. Se chamar novas eleições, Dilma dará ao próprio povo o direito de eleger o novo presidente. Dará ao povo a soberania de definir o desfecho da crise. Aprovar uma PEC para eleições gerais no Congresso significa conversar com o baixo-clero e apontar para o pescoço de Eduardo Cunha, que virá fervendo para mais um round da despolítica brasileira.
Michel Temer só assumiria interinamente a presidência até as eleições, confirmando seu caráter decorativo. Um governo permanente de Temer trará alta instabilidade política, social e econômica até pelo menos 2018. Há muitos responsáveis pelo atual estado de coisas, mas é melhor respirar fundo, colocar momentaneamente as diferenças de lado e apontar uma saída. No domingo, enquanto uma pequena multidão gritava contra o golpe na frente da Fiesp, na Avenida Paulista, uma pequena turma, verde amarela, se aproximou com uma grande bandeira pedindo novas eleições. Se não dialogarmos em torno das ideias que nos unem, seguiremos cavando em conjunto o buraco no qual nos enfiamos. Por isso, o meu voto é sim, para novas eleições já.
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