Boda de Urna
(escrito por: Antonio Prata)
Você tem até as cinco da tarde deste domingo pra decidir se continua casado com a atual, se reata com a ex, se foge com a amante ou começa uma nova relação. Complicado, hein, Brasil?
O casamento não tá lá essas coisas, mas vai que é só uma fase? Vai que é possível reacender a velha chama e voltar à época em que, todo dia, era ripa na chulipa e PIB na gorduchinha? Hoje, com o pibinho entre as pernas, você se agarra às memórias. Não são poucas: nestes 12 anos, muita coisa aconteceu. Você conseguiu financiar sua casa (sua vida), seu carro, sua TV de tela plana.
Você está gordo e, no entanto, se sente vazio. Será que as suas expectativas é que eram muito altas? Drummond, janelas sem grades e ressonância magnética ao alcance de todos era uma viagem de LSD? O que você sabe é que esperava bem mais deste longo matrimônio do que a popularização do LCD.
Outro fator que vem minando a convivência é a família da moça. Dos mais próximos você gosta, mas tem uns primos e uns cunhados que são casca-grossa. Quando aparecem prum churrasco ou pro Natal, sempre some cinzeiro, ímã de geladeira, até gasolina do seu carro já levaram.
Eis então que no meio da crise ressurge, repaginada e murmurante, a sua ex: “Volta pra mim, Brasuquinho! Foi aqui que tudo começou! Eu te encontrei na sarjeta, com a poupança ralada, virado no overnight, enchendo a cara de Old Eight com default. Se não fosse eu te tirar do delírio e te trazer pro Real, não tinha casa, carro, tela plana e o escambau!”.
De fato, você foi feliz com a ex, no início. Quando a vida estabilizou, houve alguma euforia: comeram frango com iogurte, cantaram axé no videokê. Mas então, em vez de decolar, você estagnou. Faltou um tchan, sei lá. Sem falar que os primos e cunhados da ex tampouco eram flor que se cheire –há rumores de que você só ficou com ela por oito anos porque os aparentados subornaram a ala da família que defendia a alternância do cônjuge, a cada quatro anos.
Por essas e outras, ultimamente, você andava aflito, dilacerado entre o bege do presente e o cinza do passado –e foi aí que apareceu, verde fosforescente, uma amante! Em poucos dias, ela arrebatou seu coração. Prometeu vida nova e um relacionamento sustentável. Vocês poderiam escolher, juntos, os primos e cunhados de quem iriam se aproximar –primos ou cunhados desmatadores ou da indústria armamentista, jamais!
“Que mulher moderna! Que bom que você surgiu!”, você co-memorou. “Foi a providência divina que me pôs no teu caminho!”, ela respondeu –e você estranhou. Então, descobriu que ela ouvia salmos no iPod, era contra a descriminalização do aborto e não apoiaria o casamento gay. Você perguntou se isso era verdade e ela disse que não, era o contrário –depois disse que era o oposto do contrário e, depois, o avesso do oposto do contrário. O verde que, de longe, parecia ser de frescor, de perto recendia a mirra. Não era essa, exatamente, a boa nova que você procurava.
Agora você tá aí, indo encontrar as três, juntas, pra escolher uma delas ou apostar numa quarta. Pior é que não pode nem tomar uma cervejinha antes, porque o TSE não quer que você decida, bêbado, com quem vai passar os próximos quatro anos da sua vida. Complicado, hein, Brasil?
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