“Conhece-te a ti mesmo”
Não é novidade que as tecnologias digitais estão cada vez mais presentes na intermediação da nossa comunicação e sociabilidade. Por onde nos deslocamos, levamos nossos smartphones a tiracolo e permanecemos tanto tempo online no ciberespaço que não é à toa que o espaço físico é o considerado offline (desligado). E aí que reside minhas inquietações, estamos ficando offline de nós mesmos? Estamos tão conectados com o “mundo inteiro” que nos desconectamos de si e do próximo? Longe de querer fazer um diagnóstico tecnofóbico e sugerir um ingênuo retorno ao mundo predominantemente analógico, como se isto fosse resolver o mal estar da nossa solidão interativa.
Proponho cautela sobre as possibilidades redentoras da Internet e uma reflexão sobre o uso que estamos fazendo desses intermediários comunicacionais no nosso cotidiano. O problema não é a técnica, não é o smartphone, tampouco as redes sociais virtuais. Não existe uma natureza definida nos aparelhos tecnológicos e nos usos que fazemos das redes comunicacionais. Tais usos, para usar um trocadilho, podem ser uma extensão das nossas interações face a face (quando existem no espaço físico) como também Face a Face (quando construídas virtualmente).
Em um texto sobre a luta pela privacidade, o professor e também filósofo Renato Janine, afirma que nossa vida se tornou um smartphone aberto. Trata-se mais do que a apropriação mercadológica da inteligência coletiva nas plataformas digitais. Ou seja, da vigilância eletrônica em massa por Estados e Corporações com finalidades escusas. Trata-se do que Janine chama de servidão voluntária. Do quanto que escancaramos nossas vidas no ciberespaço, indistinção entre a nossa vida pública e privada. Refletimos antes de tornar algo público e questionamos a quem interessa o que estamos publicando? As plataformas informacionais nos dizem mais sobre nós mesmos do que nós nos conhecemos e paramos para refletir sobre si?
Por meio de processo de georreferenciamento, o Google diz exatamente o bairro em que estou e o Facebook sugere o lugar a ser marcado na minha foto. Recebo emails com sugestões de livros que versam exatamente sobre minhas preferências sociológicas e meu nome é evocado unissonante nas publicidades feitas sob medida para mim. Dia desses recebi um email do serviço de armazenamento e compartilhamento de arquivos Dropbox dizendo para que eu voltasse a usá-lo, pois ele estava se sentindo solitário. Dropbox solitário? Pois é, humanização da técnica é uma ótima estratégia de marketing. Tecnicização do humano também?
A enxurrada de conteúdos nos dá uma falsa noção de que o excesso de informação se reverbera em muito conhecimento sobre algo, sobre si ou sobre o mundo. Ledo engano. Na máxima socrática “Conhece-te a ti mesmo” deve repousar nossa reflexão. Delegar menos à técnica aquilo que é o nosso papel: refletir e conhecer a si mesmo para mudar a si e o mundo ao nosso redor. Não automatizar todas as nossas ações. Curto, compartilho, logo existo? Isto é colocar a vida no piloto automático. Precisamos de reflexão para sair da monotonia. Possuir as coisas e não nos deixar possuir por elas. Por fim, quando você estiver na sua página principal do Facebook e visualizar a famosa pergunta: No que você está pensando agora? Faça exatamente o que diz a frase: Pense!
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Wikipédia: “Ela” é um filme estadunidense de comédia dramática, ficção científica e romance de 2013 escrito, dirigido e produzido por Spike Jonze. O filme é estrelado por Joaquin Phoenix, Amy Adams, Rooney Mara, Olivia Wilde, e Scarlett Johansson como a voz de Samantha. O filme gira em torno de um homem que desenvolve uma relação com um sistema operacional inteligente de computador (OS), com uma voz feminina e personalidade.
Socióloga, Mestre em Sociologia (2018) e Bacharela em Ciências Sociais (2014) pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Pesquisa tecnologias cívicas, ciência aberta, democracia digital, algoritmos e sociedade de controle.